segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Ausencia


Ausência







Eu deixarei que morra em mim


o desejo de amar os teus olhos que são doces


Porque nada te poderei dar


senão a mágoa de me veres eternamente exausto


No entanto a tua presença


é qualquer coisa como a luz e a vida


E eu sinto que em meu gesto


existe o teu gesto e em minha voz a tua voz


Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado


Quero só que surjas em mim


como a fé nos desesperados


Para que eu possa levar


uma gota de orvalho


nesta terra amaldiçoada


Que ficou sobre a minha carne


como nódoa do passado


Eu deixarei...


tu irás e encostarás a tua face em outra face


Teus dedos enlaçarão outros dedos


e tu desabrocharás para a madrugada.


Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu,


porque eu fui o grande íntimo da noite.


Porque eu encostei minha face na face da noite


e ouvi a tua fala amorosa.


Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa


suspensos no espaço.


E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.


Eu ficarei só


como os veleiros nos pontos silenciosos.


Mas eu te possuirei como ninguém


porque poderei partir.


E todas as lamentações do mar,


do vento, do céu, das aves, das estrelas


Serão a tua voz presente,


a tua voz ausente,


a tua voz serenizada.






Vinícius de Moraes

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